agosto 22, 2008

Mais ou menos Estado na prática do desporto

Desloquemos por breves instantes o nosso olhar do desporto “espectáculo” lançando-o no desporto “prática”. Passamos, então, do papel de observador - passivo, para o papel de actor principal - activo. Independente da sua condição – adulto mais ou menos jovem, com ou sem limitações físicas ou intelectuais, rico ou pobre,… – o que pode a prática desportiva fazer por si? O que pode fazer o desporto àqueles que estão sob a sua guarda? Presumo que estará a pensar em benefícios higienicistas, estará a pensar no seu potencial socializador, estará a pensar na sublimação da vida, na formação do carácter…

Pense agora no que você poderá fazer pela prática desportiva, sua ou dos seus concidadãos. Observe as condições de prática que tem ao seu dispor, se existe oferta variada, pense nas oportunidades (ou falta delas), enfim, pense nos meios que são colocados ao seu dispor pela comunidade onde está inserido para satisfazer uma putativa vontade de praticar desporto.

Este simples exercício pode ser o mote para se recentrar a discussão sobre o tema desporto a partir de uma importante dimensão – a prática desportiva. Apesar de vivermos num tempo em que o desporto espectáculo parece relegar para um plano secundário as restantes dimensões que o conceito encerra, há que procurar perceber como o Estado assume ou não a responsabilidade de promover a prática desportiva. E como já estamos num plano ideológico, há que procurar saber se o Estado deve ou não assumir essa responsabilidade ou se deve ser o mercado a determinar quem pode ou não fazer desporto.

Aguardo para ver como este tema será tratado no debate nacional sobre o estado da nação desportiva suscitado pelo presidente da Confederação do Desporto de Portugal.

Cumpridores de promessas alheias

O filme desta olimpíada ainda não terminou. Não só porque ainda há atletas em competição, como será necessário um período de nojo em que se faz o balanço e se relança a próxima olimpíada.

Precipitadamente, o presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP), Vicente Moura, que anunciou o seu afastamento precoce da presidência do comité olímpico, ainda não deu sinais de ter percebido que cometeu um erro crasso “protocolarizando” resultados que não dependem directamente de si e para os quais ele não pode concorrer fora da arena de jogo. Por muita confiança que deposite nas capacidades dos atletas de elite, mesmo que justificada por resultados anteriores, ele nada poderá fazer para obstaculizar os resultados da concorrência directa e agir sobre os factores de rendimento de cada atleta em competição.

Ora, “protocolizar” medalhas a troco do incremento dos subsídios do governo, só para ganhar uns trocos, para o apoio aos atletas em cada ciclo olímpico é um erro de palmatória que apenas serve os interesses do próprio governo: por um lado, se correr bem, pode exibir os resultados e retirar daí os dividendos políticos; por outro lado, se correr mal, remete a culpa para a programação do COP. Aliás, nos dois intervalos deste filme olímpico (quando correu mal – eliminação do três atletas “medalhavéis”; quando correu melhor - medalhas da Vanessa e do Nélson) observámos os dois registos nas declarações prestadas à comunicação social pelo Secretário de Estado da Juventude e do Desporto.

Não deixa de ser curioso o paralelismo entre este episódio burlesco e os termos em que foi imposto aos professores um determinado modelo de avaliação do desempenho. Os professores, tal como os atletas, viram-se obrigados a resultados, embora desejáveis, insusceptíveis de garantir. O ME, neste caso, fez o papel do COP.

Triste sina a nossa!…

Brincar aos ciclos olímpicos

O presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP), Vicente Moura, que ontem anunciou que pretende abandonar o cargo, defendeu esta quarta-feira que para Portugal ganhar as medalhas desejadas nos Jogos Olímpicos é necessário rever todo o sistema desportivo do País, na medida em que a acção única do COP é manifestamente insuficiente.
“Se é preciso vir aqui ganhar algumas medalhas é o sistema desportivo português que tem de responder. O COP, naturalmente, com certeza o Governo também, as escolas, o desporto escolar, autárquico e universitário. É todo o sistema integrado de desenvolvimento desportivo. Tem de ser tudo avaliado”, defendeu. (In: Correio da Manhã)
Invariavelmente, no final de cada ciclo olímpico, face à eterna insatisfação pelos resultados alcançados, depois de vermos rolar meia dúzia de cabeças, ecoa a trombeta de alarme: há que parar o país para um debate nacional sobre o estado da nação desportiva.
A moderadora que o país consagrou, depois de regressar dos banhos, agendará dois ou três Prós e Contras com os snipers convidados de sempre. Depois dos desabafos mais ou menos comprometidos dos sujeitos directamente envolvidos, das escapadelas por intervalos da chuva dos políticos e de dirigentes federativos, depois de serem crucificados meia dúzias de atletas desbocados, o país sossegará até final do próximo ciclo olímpico.

O circo do faz-de-conta é nauseabundo!

Urge rever todo o sistema desportivo do País não só pela legítima ambição de fabricarmos campeões, senhor presidente do Comité Olímpico de Portugal, mas, fundamentalmente, porque há que combater o analfabetismo motor das nossas crianças e jovens. E não me refiro à falácia da oferta de actividade física avulsa, como se infere da LBAFD (lei de bases da actividade física e do desporto). Estou a pensar no conceito amputado de desporto que os nossos representantes políticos nos querem impor.

Perdoa-me

Francis Obikwelu anunciou hoje [como o Obikwelu na sua prova, cheguei à notícia com algum atraso] o fim imediato da carreira no atletismo e pediu desculpa aos portugueses por não ir à final dos 100 metros, com o argumento de que era pago por eles para estar nos Jogos Olímpicos. (in: Diário Digital)
As declarações do Obikwelu tiveram um efeito imediato: serviram de padrão de uma atitude de autoflagelação pública para aqueles atletas que não obtiveram os resultados expectáveis. Um atleta cuja prestação olímpica fique aquém do que seria desejável deve ser crucificado em praça pública, a não ser que seja redimido através de um acto de contrição e peça desculpa aos portugueses, de preferência em directo televisivo. É a única forma de minorar a dor da plebe. Este veredicto popular é subscrito pelos penduras olímpicos - responsáveis federativos e ilustres representantes do povo –, que numa atitude sobranceira, despudorada e de populismo barato, aparecem invariavelmente a sacudir a água do seu capote.

Não entendo a necessidade de um atleta ter de pedir desculpas, em público ou em privado, depois de uma pretensa má classificação. Como expliquei (?) na entrada anterior, o que se espera de um atleta é que ele se comprometa com a sua transcendência. Se o fez responsavelmente nada mais há a exigir. É este o sentido da competição desportiva.

Entendo ainda menos a necessidade da utilização de um estranho linguajar economês para explicar insucessos desportivos. Mais do que pedidos de desculpas nós queremos perceber onde falhámos e por que não somos capazes de obter resultados desportivos consistentes.

Se o Obikwelu queria prestar um serviço público fora das pistas talvez devesse ter denunciado o fosso que separa a programação olímpica espanhola da portuguesa [realidade que ele bem conhece]. Como não é possível mexer no passado, pelo menos preparávamos melhor o futuro.

Ignorância olímpica

A excelsa capacidade de superação é um atributo de um desportista de elite. Que bom seria se todos nós fossemos capazes de captar e descodificar os sinais reveladores dessa capacidade. O fenómeno desportivo não teria, apenas, um quadro de referência: a contabilidade do merceeiro.
Pelo teor de alguns comentários depreciativos proferidos por dirigentes desportivos e profissionais da informação após putativos insucessos desportivos fico preocupado. Não deveriam eles olhar para o desporto olímpico e revelar a multiplicidade dos seus aspectos, exaltando a sua valia axiológica e antropológica, aceitando os limites e as limitações de todos?
No ideal olímpico perpassa a ideia de que todos podem vencer. Todos. Porque TODOS se transcendem face às suas circunstâncias. Eu sei, tal como qualquer atleta sabe mesmo que induza o espectador a pensar que não sabe, o significado da exaltação desportiva.

Como eu te percebo Marco Fortes!…

agosto 15, 2008

Lágrimas de crocodilo

Laurentino Dias acredita que Portugal ainda vai ter "uma presença positiva"
O secretário de Estado do Desporto esperava que a primeira semana dos Jogos Olímpicos fosse já "de grandes resultados" para Portugal [...]

Nas esperanças infundadas em resultados desportivos avulsos, como as que foram reveladas pelo secretário de Estado do Desporto, reside um dos males do nosso desenvolvimento desportivo: a política de navegação à vista!