maio 29, 2007

Escola Pública quem és tu?

Apesar dos momentos difíceis que a Escola e o Sistema Educativo atravessam continuo a gostar de ensinar. Sou professora por convicção. E é exactamente porque vivo a Escola que estou preocupada com a confusão que se está a instalar no sistema educativo. Falo de programas, de rigor, de motivação, de organização, de igualdade, de estigma, de criatividade e de outras “coisas” que se relacionam com o “pulsar” da escola e da comunidade escolar. Antes que, também eu comece a ficar confusa, gostava de lançar algumas questões para partilhar a minha angústia face ao que está a acontecer. Não podemos assistir de “braços cruzados” àquilo que diz respeito a todos nós.

  • Porque continuam, os nossos governantes, a ignorar que existe uma grande percentagem de alunos a quem a escola e o gosto por aprender pouco ou nada dizem?
  • Porque insistem em querer ensinar conteúdos, embora falem de objectivos e competências, que se afastam dos reais interesses e motivações dos seus destinatários? Conhecerão os fazedores dos programas a Escola real?
  • Estará a Escola verdadeiramente empenhada em promover aprendizagens significativas para os alunos?
  • Não será desejável que o rigor e a exigência da Escola coabitem com a diferença?
  • O que mudou realmente na Escola?
  • Quem mudou na Escola?
  • O que é necessário mudar na Escola?
  • O que precisamos de fazer para que a Escola mude efectivamente?
Sem querer ferir susceptibilidades atrever-me-ia a dizer que a sociedade tem vindo a mudar mas a Escola pouco ou mesmo nada mudou. Nada daquilo que é essencial. A Escola foi aceitando como “normal” algumas práticas e comportamentos sem reflectir sobre as suas causas e efeitos.
Julgo ter havido pouca criatividade na elaboração dos currículos destinados aos alunos com dificuldades. Sim, digo com dificuldades porque não adianta escamotear este facto. Será correcto submeter estes alunos a um mesmo currículo? Quem deverá decidir? O aluno e o Encarregado de Educação? Terão eles argumentos para esta decisão? Este é um problema que se agrava quando falamos dos alunos que não gostam da Escola, isto é, aqueles que não querem aprender. O que fazer com estes alunos? Se é preciso mantê-los na Escola, porque não lhes ensinamos outras “coisas”? Porque insistem em querer ensinar-lhes Matemática se a Aritmética pode ser mais importante para a suas vidas? Este é só um exemplo, poderíamos arranjar muitos outros. Como podem estes alunos ter sucesso? Por favor, não confundam sucesso com nota positiva para passar. A isto chama-se camuflagem do insucesso. Este não é um caminho sério.
Falando de estigma, alguns agentes educativos, não concordam com a formação de turmas homogéneas. Não é esta uma forma de respeitar os ritmos de aprendizagem dos alunos? Não estaremos a descurar os bons e os muito bons? Não estará a Escola Pública de costas voltadas para os alunos bons? Não estará a Escola a pautar os seus horizontes e a nivelar o seu rigor por baixo? Penso que a Escola e os Professores não podem conduzir a sua acção só, ou na maioria das vezes, em função dos alunos problemáticos e dos alunos com dificuldades de aprendizagem. A Escola tem de ter um rumo bem definido e não pode desviar-se nem demitir-se das suas funções.

Clementina Campelo

5 comentários:

Amândio Graça disse...

A escola pública, ao contrário do que se possa pensar está a mudar, a mudar aceleradamente, mas não necessariamente a mudar para melhor. A burocracia, o controlo e a prepotência parece-me que tem vindo a crescer desmesuradamente e a pôr na defensiva e a desanimar inclusive os professores mais generosos, os mais criativos e os mais empenhados.
Agora cuidado, os rankings de escolas, a livre escolha de escolas, a livre escolha de escolas públicas ou privadas, o financiamento das escolas em função da sua produtividade (rankings nacionais) e não do seu carácter público ou privado, a promoção dos professores em função de resultados nos exames, os diplomas de frequência para os alunos que não "são capazes" ou não querem aprender, tudo isto conjugado em nome da melhoria da qualidade do ensino, o que faz é contribuir para cavar o fosso das desigualdades sociais e ainda por cima a expensas dos impostos de muitos cujos filhos são vistos como enteados do sistema educativo.
O nivelamento por baixo é iniquo, mas há também muito gato escondido com o rabo de fora, por trás dessa crítica ao nivelamento por baixo.
A defesa da Escola Pública passa em meu entender por colocar no cerne da sua missão a aprendizagem de todos os alunos que a frequentam e fazer disso um ponto de referência fundamental para organizar os programas, as relações entre os parceiros e a vida na escola.
Os problemas da escola não se circunscrevem a problemas de aprendizagem. Há muitos e graves problemas sociais e educativos. Porém na escola estes devem ser sempre equacionados na perspectiva de criar e assegurar condições para a aprendizagem.

Anónimo disse...

Não sou professora, os meus filhos são muito bons alunos.
Escandaliza-me que professores defendam o que chama de "turmas homogéneas".
"Não é esta uma forma de respeitar os ritmos de aprendizagem dos alunos?"
Não!!!! É uma forma de desrespeitar os alunos e suas famílias, de empurrar para o fosso os alunos que mais precisam de ajuda. Analisem o que acontece aos maus alunos quando agrupados- o resultado é sempre péssimo, todos o sabemos.
"Não estaremos a descurar os bons e os muito bons?"
Os bons e muito bons serão sem dúvida ainda melhores se tiverem oportunidade de ajudar a contribuir para a integração dos colegas que precisam de ajuda... não tenho dúvidas de que a sua formação será assim muito mais valiosa...

henrique santos disse...

Cara anónima
gostava de comentar o seu comentário.
Em primeiro lugar para lhe dizer que concordo em absoluto consigo. Como gostaria que os professores, na sua imensa maioria pensassem como você. De facto há em muitos professores, assim como no sector da dita "classe média" uma grande tentação para enveredar pela "solução" das turmas ditas homogéneas, perante a real crise que atravessa a situação do ensino em Portugal. Eu acho tal solução imoral, mas vemos situações, na realidade das escolas que são, na prática, a concretização de tais ideias: turmas de repetentes; turmas agrupadas que já vêm de escolas com contextos sócio-económicos desfavorecidos, turmas de professores e agora as turmas dos CEFs, dos Efas ou lá o que são. Quando não há, em primeiro lugar em quem governa, um real investimento e um claro projecto moral para a Educação, servido por competência técnica para servir todos os alunos, tudo isso dá azo a que as coisas funcionem mal e que depois se procurem falsas "soluções", que naturalizam e cavam as desigualdades.

Miguel Pinto disse...

"Analisem o que acontece aos maus alunos quando agrupados- o resultado é sempre péssimo, todos o sabemos." (anónimo)

hummm.... creio que os maus alunos agrupados fazem as turmas dos CEF's e pelo que me é dado observar [acreditando nas classificações que os professores lhes atribuem] terminam o ciclo [e não sei se sabem ler ou escrever] com um diploma e tudo.
Isto não significa que estou a defender a constituição de turmas de nível, bem pelo contrário!

«« disse...

Cara Colega Clementina, o seu artigo está óptimo, apesar do meu desacordo com as turmas de nível, é importante que se diga que a escola de hoje alimenta a mediocridade, é uma escola para falhados e podia ser melhor, senão vejamos:

- porquê se dá apoio a um jovem que tem cinco (de 0 a 20) e o ano perdido e não se dá apoio a um outro que tem 18 e quer chegar ao 20?

- porquê se criam estigmas quanto às condições de progressão sem abrir excepções para os alunos que sem serem bons a português e a Matemática, são autênticos “génios” nas outras coisas;

- Porquê se teima em ensinar o Camões e outros a alunos que na sua maioria não têm maturidade para isso;

- é importante saber ler português, saber interpretar o português, não acho que seja importante a diarreia intelectual dos autores do passado que um número imenso (será de velhos do Restelo?) teima em prepetuar, fazendo daquela disciplina um autentico massacre?

- porquê se teima em fazer exames de grau de dificuldade incrível e despropositados para o nível de ensino da escola real (e depois só se acusa os governantes de autismo, mas os que fazem exames não ficam em nada atrás);

…. Enfim muitos porquês andam por aí, discordo que a escola não esteja em mutação, discordo mesmo e a maior mudança foi torná-la o templo da instrução, deixando as questões da educação para “ninguém”, assassinou-se o currículo oculto sob o argumento que os putos não podiam ficar parados, daqui a uns anos teremos os autómatos sociais, óptimos para os patrões manipularem, óptimo para os governantes dizerem como o ministro das finanças que assume que o facto do estado ter gasto mal 140 milhões de contos é uma ninharia….por tudo isto parabéns pelo seu texto, apesar das discordâncias..