novembro 22, 2007

Desafio

No último post o Miguel trouxe-nos a identificação de alguns problemas da Educação Física nos países da União Europeia.
Começa logo pela seguinte frase que cito: "Orientação geral da educação física: os curricula existentes não proporcionam muitas vezes experiências pertinentes a nível pessoal e social e são contrários às tendências sociais e às tendências nas actividades extracurriculares".
Pergunta a fazer desde já: será que os nossos curricula de EF em Portugal padecem do mal identificado na frase acima e sua sequência (que poderão ler no post anterior e no relatório)?
Já agora eu começo por dar uma resposta pessoal. Penso que sim. Os nossos programas de EF que têm muita coisa interessante e positiva, têm alguns aspectos que sinto constituirem um espartilho a uma EF adaptada aos tempos e aos alunos de hoje:
-Tem um modelo de multiactividades que subentendem, pelo menos antes do Ensino Secundário, uma prática de demasiados desportos num mesmo ano lectivo. De tudo querer abordar pouco se aprofunda e consolida. Não estará nisto uma das origens do fenómeno dos eternos debutantes?
-O fenómeno anterior implica, com a necessidade de "cumprir os programas" que abordando tanta coisa não haja espaço para a exercitação.
-A preocupação anterior não levará, naqueles que querem cumprir os programas, a concederem pouco tempo a uma prática lúdica das actividades ensinadas? É que para cada actividade não haverá um tempo de experimentar, um tempo de aprender, um tempo de exercitar, um tempo de brincar, um tempo de aplicar e de avaliar o que se aprendeu. Saltitando demasiado de actividade há tempos que se perdem. Nuns casos só se brinca o que é pouco, noutros não há tempo para brincar, o que faz falta.
-Há demasiados alunos a quem as nossas actividades passam ao lado e para quem são nitidamente insatisfatórias. Os gordinhos, os desajeitados, etc, são realmente tantas vezes excluídos sucessivamente por um modelo desportivizado num sentido mal trabalhado pedagogicamente.
-A EF e o Desporto na escola tem de ser (em alguns momentos) tão entusiasmante como o são os jogos de computador se quiserem ganhar este desafio. É que a questão não é também, simplesmente de mais tempo para a EF.
O problema evidentemente não está só nos programas ou se calhar fundamentalmente nos programas. Mas não haverá aqui todo um programa de acção a realizar num futuro imediato?
O desafio do relatório de uma organização política europeia que agora apareceu é, penso eu extremamente aliciante para os professores de EF. A contrastar com estes tempos de tantos desafios nefastos da nossa política educativa interna.

novembro 13, 2007

Problemas identificados

Há alguns problemas relacionados com a educação física na UE:
  • Orientação geral da educação física: os curricula existentes não proporcionam muitas vezes experiências pertinentes a nível pessoal e social e são contrários às tendências sociais e às tendências nas actividades extracurriculares: há uma orientação para programas de actividades ligadas ao desempenho e à competitividade. Se se quiser que a educação física se torne um instrumento para combater eficazmente a obesidade e o excesso de peso das crianças, é necessário promover elementos curriculares que atraiam todos os grupos de alunos. Com os jogos de computador a ganhar terreno como passatempo preferido das crianças, há uma necessidade cada vez maior de promover um estilo de vida activo e saudável entre as crianças e os jovens. Para estes grupos de jovens, o conteúdo tradicional da educação física tem pouca relevância para o seu estilo de vida.
  • A educação física corre o risco de ser cada vez mais marginalizada na escola. Nos últimos anos, o tempo atribuído à educação física em toda a UE diminuiu gradualmente: desde 2002, o tempo concedido foi reduzido de 121 para 109 minutos por semana para a escola primária, e de 117 para 101 minutos para a escola secundária - Os estudos realizados recomendam que as crianças e os adolescentes pratiquem diariamente algum tipo de exercício físico durante 60 minutos! Há indícios de que o que se anuncia oficialmente no que respeita à actividade física praticada nas escolas não corresponde à realidade no terreno, dado que a prática não respeita as obrigações ou expectativas legais. É necessário um controlo efectivo!
  • Ligado à questão acima referida, encontra-se o insuficiente financiamento das instalações desportivas; um financiamento inadequado das instalações, do equipamento e da sua manutenção e material de ensino encontra-se particularmente espalhado na Europa Central, Oriental e Meridional; os alunos com deficiências sofrem ainda mais as consequências desta falta de apoio financeiro.
  • É necessário olhar mais de perto os curricula dos professores de educação física a fim de apoiar a formação e a educação de professores de qualidade. É necessário que haja professores competentes e fiáveis que sejam capazes de conceber aulas de educação física que respondam às questões de saúde e que incentivem todas as crianças a participar. Uma educação física eficaz e bem sucedida exige professores especializados com uma boa formação.
  • Existe um fosso entre a edução física em actividades curriculares e nas actividades extracurriculares e paracurriculares. A ligação entre actividades curriculares e extracurriculares poderia ser reforçada.
  • Inclusão: as minorias étnicas têm taxas de participação em actividades desportivas especialmente baixas. O problema da participação já é preocupante durante o período escolar: as raparigas muçulmanas são um grupo especialmente sensível neste contexto. Um padrão semelhante de acesso restrito é evidente entre os jovens deficientes. Os jovens com deficiência têm muito menos probabilidades de participar em actividades desportivas extracurriculares ou paraescolares.
  • Não há ainda dados empíricos suficientes em muitos domínios relacionados com o desporto, a educação física e os seus efeitos na evolução social e sanitária.
Estas observações constituem a base das recomendações que o relator sugere no seu relatório no que respeita a medidas a tomar pelos organismos responsáveis, quer a nível europeu, quer a nível dos Estados-Membros, a fim de melhorar o papel do desporto na educação. (In: Relatório sobre o papel do desporto na educação, PE)

Recomendações que cairão em saco roto?…

Parlamento Europeu defende mais aulas de educação física nas escolas da UE
“O Parlamento Europeu defendeu hoje, ao aprovar um relatório sobre o papel do desporto na educação por 590 votos a favor, 56 contra e 21 abstenções, que a educação física deve ser obrigatória na escola primária e secundária, com pelo menos três aulas por semana. O relatório da Comissão da Cultura e da Educação do PE refere que em Espanha, Portugal e Itália os níveis de excesso de peso e de obesidade são superiores a 30% nas crianças com idades compreendidas entre os 7 e os 11 anos.

O PE propõe que o horário escolar inclua, pelo menos, três aulas de educação física por semana, embora as escolas devam, na medida do possível, ser incentivadas a ultrapassar este objectivo mínimo; para que haja um equilíbrio entre as actividades físicas e intelectuais durante o período escolar.

Os eurodeputados exortam os Estados-Membros a investir em instalações desportivas de qualidade nos estabelecimentos de ensino e nos centros de treino e afirmam ser favoráveis à concessão de incentivos aos clubes desportivos; que celebrem acordos de colaboração com escolas, estabelecimentos de ensino, centros de jovens, e outras organizações comunitárias ou de voluntariado envolvidas em projectos no domínio da aprendizagem ao longo da vida.

O aumento da obesidade em toda a Europa, nomeadamente entre os jovens, é alarmante e constitui uma grande preocupação no domínio da saúde pública. O número de crianças da União Europeia com excesso de peso e obesidade aumenta em mais de 400.000 por ano, para além dos mais de 14 milhões de cidadãos europeus que já têm excesso de peso (incluindo, pelo menos, 3 milhões de crianças obesas), indica o relatório de Pál SCHMITT (PPE/DE, HU).

De acordo com os dados do relatório, a obesidade afecta actualmente 21 milhões de crianças na UE. Na UE-27, o excesso de peso afecta quase uma em cada quatro crianças. Em Espanha, Portugal e Itália os níveis de excesso de peso e de obesidade são superiores a 30% nas crianças com idades compreendidas entre os 7 e os 11 anos. As percentagens do aumento do excesso de peso e da obesidade na infância variam, com a Inglaterra e a Polónia a registarem os maiores aumentos. Em termos gerais, as crianças estão em pior forma física do que a geração dos anos 70 e 80.

Não é tanto o aumento da dose de calorias que provoca o excesso de peso, mas a inactividade física: as crianças não comem mais, mexem-se menos, afirma o relator.

Nos últimos anos, o tempo atribuído à educação física em toda a UE diminuiu gradualmente: desde 2002, foi reduzido de 121 para 109 minutos por semana para a escola primária e de 117 para 101 minutos para a escola secundária.” (appefis)
Estas recomendações sugerem-me apenas dois breves comentários: o primeiro formula duas simples questões que traduzem a minha estupefacção diante da nossa triste realidade; o segundo traduz a minha desconfiança nos actuais responsáveis políticos quando confrontados com recomendações que sugerem a inversão do rumo das suas políticas.

1. Não sei o que dizer dos 90 minutos semanais de EF atribuídos aos profissionais? E o que pensar dos 45 minutos semanais atribuídos aos CEF’s?
2. Como enquadrar estas recomendações numa escola de matriz taylorista?

Riscos...

De tempos a tempos, numas e noutras escolas, mesmo em contextos sociais diversos, surgem umas ondas de preocupação com os acidentes na escola.
Jogar à bola, uma actividade que fez parte das brincadeiras de várias gerações anteriores à nossa, e que por enquanto ainda integra a ocupação dos tempos livres espontânea de uma parte dos nossos jovens, parece ser objecto de uma preocupação, na minha opinião, desajustada.

Já não bastam as limitações impostas, em termos de espaços disponíveis para brincar, nas ruas das cidades actuais, que por razões de segurança e não só, já não são uma opção, agora parece que nem na escola as crianças e os jovens podem alternar com alguma actividade física a longa inércia a que são submetidos na sua pesada carga horária semanal composta quase exclusivamente por trabalho sedentário, no qual, estar “calado” e “quieto” é sinónimo de bom comportamento. Se isto não é trabalho infantil …

Aqui que eles não nos ouvem, não é de admirar que não estudem muito fora das aulas ou que se “portem mal”, como frequentemente são acusados: não sei se nós, adultos, nos portaríamos melhor num esquema de trabalho semelhante… a ver por algumas reuniões de adultos…

Mas voltando ao assunto que aqui me trouxe…
Tudo na vida contém riscos, desde o atravessar a rua ao ficar em casa! Já vi dentes partidos pelas mais variadas razões… até por tropeçar num espaço plano!
Lembro-me de um filme em que o personagem principal, sendo mediador de seguros, enumerava em cada momento da sua vida as percentagens de risco associadas a cada gesto: andar na rua passando por cima das tampas de saneamento, comer amendoins da mesma taça de outras pessoas, comer bolo de aniversário, andar de elevador, andar de bicicleta, etc.

Também não me parece sensato negligenciar determinados riscos perfeitamente evitáveis, como andar de carro sem cadeira adequada, no caso das crianças, ou andar de bicicleta sem capacete… Eu própria também andei de bicicleta sem capacete, porque não era costume ou não havia tal chamada de atenção, na época, mas adiro sem relutância a esta medida preventiva de determinadas consequências de um acidente,… embora não proteja de todos os riscos possíveis, claro!

Quando vou buscar o meu filho ao infantário e ele aparece com a roupa toda suja e as unhas cheias de terra ou riscos de canetas, eu tenho a certeza de que brincou e se divertiu. O contrário já não me dá tais garantias!... Claro que preferia que não se magoasse, mas prefiro que brinque! Nada substitui as aprendizagens e as vivências proporcionadas pela actividade física que a brincadeira encerra.

A joelhada, a cabeçada e a esfoladela são riscos provenientes da prática de actividades físicas em que existe contacto, como o Futebol, mas não podemos ter a veleidade de pensar que tais actividades detenham a exclusividade destes riscos.

Aliás, tendo em conta os estilos de vida prevalecentes, hoje em dia, não posso deixar de pensar que os riscos inerentes à sua inactividade física serão bem maiores. Seguramente, os riscos de ver televisão a mais também não serão de negligenciar.

Claro está que a Educação Física vem logo à baila e daí a ser considerada uma actividade perigosa é um instante. E então para atribuir culpas à negligência dos respectivos professores, nem se fala.
Mas de uma coisa não tenho dúvidas: quanto menores forem as vivências motoras anteriores, maior será o risco de um aluno se vir a magoar.